sábado, 23 de fevereiro de 2013

fogo

Ela dobrou a carta novamente e a colocou em um dos bolsos da jaqueta, se levantou, colocou a mochila nas costas e começou a andar ouvindo suas músicas preferidas e fumando os últimos cigarros do maço.
Ela entrou naquela rua, a rua da sua antiga escola, deu uma volta no bairro, colheu algumas rosas pelo caminho, fazendo pausas para fechar os olhos e lembrar de momentos bons. Ela caminhou até o ponto mais alto, era lá o lugar onde ela não sentia nada além do vento batendo forte no rosto, onde ela passava o tempo escrevendo poesias sobre si mesma, ela via boa parte da cidade lá de cima.
Sentou-se na grama, observando o céu, que começaria a escurecer dentro de umas duas horas e pensando que daria tempo. Escreveu uma resposta para a carta que lera há algumas horas e no post scriptum um pedido de desculpas destinado àqueles outros que ela tanto amava; se levantou e continuou a caminhar.
Entrou naquele pequeno prédio de sete andares, aquele que sempre a acolhia. Antes mesmo dela nascer funcionava ali um dormitório para trabalhadores de uma fábrica próxima, era o que ela sabia por histórias. O prédio tinha as paredes manchadas pelas chamas que um dia o invadiram; ela subiu as escadas passando a mão esquerda pela parede suja, sujando também seus dedos, parando em cada andar para que as cenas dos dois últimos quartos vazios viessem em sua mente, como se ela estivesse andando pela sua vida, revendo, assistindo tudo de novo.
Ela finalmente chegou ao terraço, colocou a mochila no chão, as rosas e a carta, já dobrada e com manchas negras de sujeira, ao lado dela, observou que o fogo tinha feito com que uma das pequenas paredes que cercavam o lugar caísse, se sentou no chão balançando as pernas no ar, acendeu o último cigarro e começou a chorar e sorrir, ao mesmo tempo. Agora o seu rosto também estava com manchas negras nas bochechas, ela secou as lágrimas que caíam, e a fazia sentir cócegas, com os dedos sujos. Ela olhou para baixo e viu aquele lugar abandonado, feio, sujo... fechou os olhos e imaginou todos que ela amava juntos, sorrindo para ela.
O cigarro acabou, a lista de reprodução também... ela se levantou, abriu os braços e deixou seu corpo cair.